A Terra e os Homens “Um debate que nos una a todos”

A Terra, os homens e o ambiente vão estar em debate no Jornal da Família. A partir da edição de março, Carlos Campos assina a rubrica “A Terra e os Homens”.

Constantemente nos falam do Ambiente, do desenvolvimento sustentável, das alterações climáticas, da pegada de carbono, da separação dos resíduos, da reciclagem, da economia circular. A defesa do Ambiente deixou de ser um tema circunscrito a um setor limitado de estudiosos e ativistas. Está presente nas leis, que estabelecem novas exigências, na comunicação social, que refere novos riscos ambientais e na publicidade que nos quer vender produtos “amigos do ambiente”. Todos somos chamados a participar, de uma forma ou de outra.

Em Junho de 1972, a Declaração de Estocolmo, aprovada pela Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente, marcou a passagem da era “eco-ativista” para a era do direito do ambiente. Já em 1971, na Carta Apostólica Octogesima Adveniens, o papa Paulo VI tinha alertado para os riscos da “exploração inconsiderada da natureza” e para a “necessidade urgente de uma mudança radical no comportamento da humanidade”. Em 1987, o Relatório O Nosso Futuro Comum, redigidopor Gro Harlem Brundtland,colocou o conceito de “desenvolvimento sustentável” na agenda política, definindo-o como “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras para safisfazerem as suas próprias necessidades”. A “Agenda 21” da Conferência do Rio de Janeiro de 1992 veio estabelecer bases para os conceitos de desenvolvimento sustentável, equidade intergeracional e integração entre desenvolvimento e proteção ambiental. O “Princípio 3” da Declaração do Rio estabelece o princípio da equidade intergeracional: “o direito ao desenvolvimento deve ser preenchido de forma a satisfazer equitativamente as necessidades de desenvolvimento e do ambiente, quer das gerações presentes, quer das gerações futuras”.

Desenvolvimento sustentável, equidade intergeracional e integração são princípios complementares de focagem do mesmo princípio. A sustentabilidade é o ângulo que nos faz ver a necessidade de preservação dos recursos naturais, evitando a sua exaustão (esgotamento) ou poluição (degradação). A equidade é o ângulo que nos faz enquadrar o Ambiente como objeto de direitos das pessoas: todos temos direito a um ambiente saudável e as gerações atuais devem preservar o ambiente para as gerações futuras. O desenvolvimento não deve acontecer à custa do ambiente, sob pena de se tornar insustentável, isto é, impossível de manter. No caso dos recursos naturais renováveis, há que os usar a uma “velocidade” inferior à da sua renovação. Por exemplo, as árvores servem para serem usadas (como sombra, ornamento, como fonte de frutos ou matérias-primas para fabrico de mobiliário, resinas, papel, etc.), desde que o abate de árvores seja mantido aquém da sua plantação e renovação. No caso dos recursos não renováveis, há que os usar de forma a evitar a sua exaustão e garantir a sua disponibilidade para as gerações futuras. Todos estes princípios se podem ilustrar com a ideia simples e fundamental de preservação de uma herança ou património, que serve para usar de modo a que não se esgote. A Terra e o universo não foram dados a uma geração, mas a todas as gerações. Este princípio moral exprime-se de diversos modos: os juristas falam de “equidade entre gerações”, os economistas falam de “manutenção da melhoria da qualidade de vida ao longo do tempo”.

Com a Carta Encíclica Laudato Si’ sobre o cuidado da casa comum, surgida em 2015, o papa Francisco recupera toda a experiência de reflexão ambiental e apresenta o tema de uma forma mobilizadora e original: “Precisamos de um debate que nos una a todos, porque o desafio ambiental, que vivemos, e as suas raízes humanas dizem respeito e têm impacto sobre todos nós”. Nunca se tinha ido tão longe na fundamentação de ideias e regras de ação ambiental. Por exemplo:

– Existe uma relação íntima entre a pobreza que existe no mundo e a fragilidade do planeta. Por isso, é necessária uma ecologia humana (o “sentido humano da ecologia”, como diz o papa Francisco) em que as metas da proteção do ambiente incluam a erradicação da pobreza;

– A necessidade de mudar hábitos insustentáveis, de abandonar a “cultura do descarte”, e de “adotar um modelo circular de produção que assegure recursos para todos e para as gerações futuras”;

– A urgência de considerar que o clima é um bem comum. Por isso, toda a ética da preservação do bem comum é convocada para os desafios ambientais.

Como levar estas ideias à nossa prática de todos os dias? Como podemos ter uma vida ambientalmente responsável, sem nos deixarmos instrumentalizar por fundamentalismos e populismos ecológicos ou pela mera propaganda comercial (eco-marketing)? A resposta está em atitudes simples como a forma como usamos a água, como lidamos com os resíduos que produzimos, como consumimos energia, como usamos a floresta, etc.. Voltaremos a estas páginas para falar desses temas. Para já, fica esta ideia inicial: se o ambiente é um debate para nos unir a todos, não há que procurar inimigos, mas sim resultados. 

Carlos Campos
Advogado

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