Conversão e novos estilos de vida

Em família e com a família promovendo a conversão e gerando novos estilos de vida. A reflexão de Juan Ambrosio para o edição de abril do Jornal da Família.

As notícias que constantemente chegam aos nossos ouvidos e aos nossos olhos levam-nos muitas vezes a pensar como a sociedade que temos estado a construir nos últimos anos parece estar a desmoronar-se por todos os lados. Apesar dos valores humanos, sempre proclamados, e da defesa da dignidade humana, sempre defendida por todos, aquilo a que assistimos mostra-nos como a corrupção parece estar presente em todos os setores da vida social e como a vida de tantos seres humanos concretos é constantemente espezinhada e maltratada. Avançamos tanto em algumas coisas e noutras temos ainda tanto caminho a percorrer. Pouco a pouco, vai surgindo uma sensação bastante agridoce, pois, se por um lado é verdade que o futuro nos abre claramente novas possibilidades, por outro, pairam muitas dúvidas no ar, pois não somos capazes de entender-nos em coisas que parecem essenciais.

Não quero de modo nenhum ser catastrofista, mas todos já sabemos, por experiência própria, como face à ausência de acordos e pontos em comum, a tendência é cada um centrar-se em si mesmo e fazer tudo o que estiver ao seu alcance para resolver e melhorar a sua situação. E quando esta situação é vivida num ambiente que, por si só, já hipervaloriza o eu, então tudo se torna ainda mais preocupante.

Sinceramente parece-me que é precisamente em momentos como estes que nos é exigido o bom senso de pararmos um pouco, não como sinal de desespero ou desistência, mas, pelo contrário, como sinal de que queremos tomar decisões capazes de introduzir as transformações necessárias que os tempos estão a pedir.

O tempo quaresmal que estamos a viver é, a esse nível, uma oportunidade única e um convite a iniciarmos o caminho da conversão e da mudança. É tempo para olharmos para a nossa vida, individual e comunitária, tentando descobrir nela aquilo que não só não a dignifica como a impede de se desenvolver. E uma vez identificas essas coisas o objetivo não é ficar aprisionado por elas fazendo delas o centro, pois essa tem sido uma das razões do problema, ou seja, centrar a vida naquilo que não a promove. Identificar essas coisas sim, deixar vencer-nos ou maniatar-nos por elas não.

Na mensagem para a quaresma deste ano intitulada «A criação encontra-se em expetativa ansiosa, aguardando a revelação dos filhos de Deus (Rom 8,19))» o papa Francisco convida-nos a olhar para esses mesmos comportamentos que violam os limites não só da nossa condição humana, como também os da natureza, sublinhando, como tem feito ultimamente, a dimensão de uma ecologia integral. 

As palavras usadas no texto são fortes, como não podiam deixar de ser, quando aquilo que está em jogo é verdadeiramente decisivo:

“Quando se abandona a lei de Deus, a lei do amor, acaba por se afirmar a lei do mais forte sobre o mais fraco. O pecado – que habita no coração do homem (cf. Mc 7, 20-23), manifestando-se como avidez, ambição desmedida de bem-estar, desinteresse pelo bem dos outros e muitas vezes também do próprio – leva à exploração da criação (pessoas e meio ambiente), movidos por aquela ganância insaciável que considera todo o desejo um direito e que, mais cedo ou mais tarde, acabará por destruir inclusive quem está dominado por ela.”

Mas o convite é igualmente claro e aponta para horizontes de transformação:

“Não deixemos que passe em vão este tempo favorável! Peçamos a Deus que nos ajude a realizar um caminho de verdadeira conversão. Abandonemos o egoísmo, o olhar fixo em nós mesmos, e voltemo-nos para a Páscoa de Jesus; façamo-nos próximo dos irmãos e irmãs em dificuldade, partilhando com eles os nossos bens espirituais e materiais. Assim, acolhendo na nossa vida concreta a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte, atrairemos também sobre a criação a sua força transformadora.”

Este é realmente um tempo oportuno para em família e como família realizarmos este exercício, de modo a irmos promovendo a conversão e gerando os novos estilos de vida que cada vez se revelam mais necessários e urgentes.

Juan Ambrosio – Professor UCP
juanamb@ft.lisboa.ucp.pt
(edição de abril do Jornal da Família)

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