O facto de termos uma das mais baixas taxas de natalidade do mundo, com a maioria dos casais novos a contentar-se somente com 1 filho, faz com que esse filho – como uma “espécie rara” – seja superprotegido. Assalta aos pais o medo de o perderem – ter um acidente ou uma doença grave, morrer, ser raptado, etc. Assalta aos pais a tentação de idolatrarem aquele filho, procurando transformá-lo numa pessoa de sucesso, sobretudo a nível académico e profissional, como nos dizia Marina Amaro, no poema “A melhor”, no Jornal da Famíliade março. Tudo isto somado, leva os pais a colocarem o filho no centro das suas vidas, passando ele a mandar em casa. A este propósito, contava-me em tempos uma psicóloga amiga, especialista nestas coisas, que uma criança, poucos dias após o nascimento, já tem “manhas”, e já sabe como chorar e quando chorar, a fim de atingir os seus propósitos: ter mimos. É claro que se os pais acodem logo ao primeiro gemido e lhe pegam ao colo, a criança não deixará de gemer quando lhe apetecer…
Começa aqui, nestes pequenos gestos, supostamente de amor, uma série de erros imparáveis que se vão avolumando no decorrer da infância, até se tornarem insustentáveis. Se não, vejamos: a criança chora, pega-se imediatamente ao colo; a criança não gosta de uma determinada comida, e muda-se a comida; já mais crescidita, evita-se dar-lhe a sopa com couves e cenouras à vista, não vá ela engasgar-se. Evita-se o peixe, pois ela pode engolir uma espinha; pão, só se for do dia, e bem quentinho; quando entra para a escola, os pais arrumam-lhe a mochila e levam-na eles, não vá o filho ficar com problemas na coluna; se possível levam-no até mesmo à porta da sala e não param de lhe dizer adeus e mandar beijos à distância; os TPC (“Trabalhos Para Casa”), se os houver, são feitos com os pais ao lado (e às vezes por estes…); quando os pais já não se entendem com as matérias, arranjam uns explicadores. Com a adolescência, estes maus hábitos, potenciados pela agitaçãodas hormonas, são “o cabo dos trabalhos”. Se não vejamos: come-se apenas aquilo que dá prazer, caso contrário ou não se come ou se refila; luta-se até às últimas consequências pela roupa variada (e “de marca”, pois claro…); exige-se um telemóvel da “última geração”, pois há que enviar SMS, jogar e ter fácil acesso à Internet; o estudo, porque exige esforço, é resolvido à custa dos tais explicadores (e desta forma nem tem que estar com atenção nas aulas, pois o explicador explica tudo e até faz os TPC, se necessário…); o mau aproveitamento e comportamento do filho é por culpa da escola, pois tem professores que não sabem ensinar e dar educação…
Fiquemos por aqui, pois o que falta facilmente se adivinha. Ou seja, os pais que não sabem educar, além de superproteger os filhos, facilitam-lhes a vida, fazem as coisas por eles, poupando-lhes o esforço, o sacrifício.
Em consequência disto, estes pais caem na tentação de moldar o(s) filho(s) à sua maneira, transformando-os em seres autómatos (ao invés de autónomos).
Neste contexto, já mais crescidos, os filhos não conseguem pensar e agir por si, precisando sempre do apoio próximo dos pais. A este propósito, dizia-me há tempos um professor do ensino superior que são cada vez mais os pais que se dirigem aos professores coordenadores de curso (o equivalente aos diretores de turma do ensino secundário) para “pedir satisfações” no que concerne à atribuição das notas. E dizia-me um especialista de recursos humanos de uma empresa que são cada vez mais os candidatos que se apresentam na entrevista acompanhados pelos pais…
Por último, e para famílias com vários filhos (pelo menos dois), ocorre o frequente erro de os pais quererem educar os filhos da mesma maneira (quando, afinal, cada um tem um estilo próprio). Para estes pais, que para serem “justos” cometem este erro, conto esta estória: «um pai bem-sucedido disse a respeito da educação dos filhos: ‘Trate-os a todos de forma igual, tratando cada um de forma diferente’» (Stephen Covey).
Não sabendo educar, os pais estão a condicionar o presente e o futuro dos filhos. Esquecem-se que «Homens e mulheres de personalidade forte e saudável são como carvalhos que crescem nas encostas das montanhas. Os ventos não os derrubam, pois cresceram na presença deles. São frondosos, têm copas grandes e o verde de suas folhas mostra vigor, pois alimentaram-se da terra fértil. Que os nossos filhos recebam o vento e a terra adubada pela nossa postura firme e carinhosa.» (Marcos Meier, Psicólogo e Mestre em Educação).
Urge, pois, inverter esta tendência “deseducativa” que paira um pouco por todo o lado, que perpassa pais e avós, comprometendo o futuro da nossa sociedade (e até da instituição familiar).
Jorge Cotovio
jfcotovio@gmail.com
(edição de abril do Jornal da Família)