Terminamos com este número o exercício que temos vindo a realizar ao longo deste ano. Nele procurámos fazer uma releitura dos primeiros números do nosso Jornal. Já lá vão 60 anos e apesar dessa distância no tempo e da sociedade em que vivemos ser muito diferente é muito bom verificar que a dinâmica que nele continua presente é a mesma de então. Os textos são agora escritos com outra linguagem, os temas não são os mesmos, mas a intenção de ter presente, de acompanhar, de ajudar as famílias, inspirando-as e apontando-lhes pistas de reflexão e ação permanece presente.
Confesso-vos que este exercício foi para mim muito bom, permitindo-me celebrar estes 60 anos de uma maneira diferente. Espero que aqueles que leram estas linhas possam também ter percebido melhor o que estava e continua a estar na origem deste nosso Jornal e qual a sua identidade.
No último nº de 1960, como seria de esperar, o Jornal da Família destaca o tempo de Natal que se vai viver. Ninguém poderia imaginar, nessa altura, nem sequer muito tempo depois, que agora, tendo passado 60 anos e estando praticamente às portas do natal, não sabemos bem como ele vai decorrer. Escrevo este texto no fim de novembro e aquilo que vamos sabendo ainda não nos permite perceber como nos poderemos organizar. Serão, por exemplo, possíveis as deslocações? Apesar das incertezas sabemos, no entanto, que este natal vai ser diferente e vai ser igual. Diferente, porque o modo de celebrarmos vai ter certamente de introduzir as diferenças que este tempo está a exigir, igual, porque o mistério celebrado é o mesmo.
Ao referir-se ao natal, o nº 12 do Jornal dizia assim:
“Este Menino que se encontra envolto em panos e deitado numa manjedoira, é o Filho Unigénito de Deus, que compadecido dos homens, vem do Céu à Terra […], para elevar o mesmo homem à comparticipação na vida de Deus. Este Menino, cuja imagem veremos reclinada em nossos presépios […] é Deus feito homem por amor dos homens, por amor de Deus seu Pai. E que vem fazer ao mundo? – Os Anjos o disseram: – «DAR GLÓRIA A DEUS E DAR PAZ AOS HOMENS QUE SÃO DO AGRADO DO MESMO DEUS”
O texto é o suficientemente claro para não precisar de grandes explicações, mas ainda assim gostaria de destacar 3 pequenas ideias que me parecem importantes (re)lembrar neste Natal de 2020.
Todas elas estão referidas ao Mistério central do natal que é, para os cristãos, a celebração da encarnação de Verbo de Deus. E o texto diz-nos bem qual o seu fundamento: o amor a Deus Pai e ao amor ao ser humano, para que este possa verdadeiramente partilhar da vida a que Aquele o convida. No fundo não se está a falar de dois amores, mas de um só que se concretiza nesta dupla via: o dar glória a Deus passa pela promoção da dignidade do ser humano e a promoção dessa dignidade é, para os cristãos, uma exigência que decorre do dar glória a Deus. É isso mesmo que o menino vem fazer e os Anjos proclamam para que todos possam ouvir.
Não sabemos bem como vai ser a configuração das nossas celebrações natalícias, mas sabemos bem que elas não podem deixar de ser um profundo hino de louvor a Deus e um verdadeiro compromisso com a dignificação de todo o ser humano, especialmente daqueles últimos que correm sempre o risco de ficar para trás esquecidos.
Talvez as nossas movimentações se vejam muito condicionadas, mas isso não nos pode impedir, pode até ser ocasião, para nos centrarmos no mais importante, naquilo porque Deus ‘fez’ o primeiro natal e que constantemente nos lembra em todos os natais: que nunca desiste do ser humano e que tem para ele uma proposta de paz e de vida em abundância.
Glória a Deus nas alturas e paz na terra a todos os seres humanos que Deus ama.
Santo Natal
Juan Ambrosio
juanamb@ft.lisboa.ucp.pt
Artigo da edição de dezembro do Jornal da Família