O amor que une os esposos, como afirma o Papa Francisco, na sua Exortação Apostólica “A Alegria do Amor”, é um “amor santificado, enriquecido e iluminado pela graça do sacramento do matrimónio”.
Daqui decorre, nas palavras do Santo Padre, que “os esposos são investidos numa autêntica missão, para que possam tornar visível, a partir das realidades simples e ordinárias, o amor com que Cristo ama a sua Igreja, continuando a dar a sua vida por ela”.
Compreende-se bem que o matrimónio não possa ser encarado como uma espécie de “seguro de vida” – do estilo “já estou casado/a, já estou arrumado/a” – ao invés é um desafio para que o casal vá construindo um projeto partilhado, com amabilidade e respeito mútuo, pedindo sempre, ao Divino Espírito Santo, a Luz para o adequado discernimento nas mais variadas circunstâncias da vida.
“Os bons relacionamentos não acontecem simplesmente: eles são o produto direto da energia, tempo, esforço que investimos neles” (Matarazzo, 1996).
É com este empenhamento que a vinculação se torna mais resiliente, criando as capacidades necessárias para enfrentar as adversidades da vida, como sejam: doenças, questões laborais, problemas financeiros, dificuldades que possam ser suscitadas pela educação dos filhos, etc.
O matrimónio é para os bons e maus momentos – daí a sua grandeza – não se trata de uma relação submetida a um regime de precariedade como, infelizmente, acontece com muitos contratos de trabalho.
É lamentável quando à precariedade laboral se adiciona a precariedade afetiva!
A não assunção do compromisso conduz , como diz o Papa Francisco, à “cultura do provisório”, que consiste na “rapidez com que as pessoas passam duma relação afetiva para outra. Creem que o amor, como acontece nas redes sociais, se possa conectar ou desconectar ao gosto do consumidor e inclusive bloquear rapidamente. (…).Transpõe-se para as relações afetivas o que acontece com os objetos e o meio ambiente: tudo é descartável, cada um usa e joga fora, gasta e rompe, aproveita e espreme enquanto serve; depois… adeus”.
Para que tal não aconteça, os casais devem estar atentos a tudo o que possa contribuir para “ferir” a sua conjugalidade, evitando, designadamente, incorrer naquilo que Gottmann (1994) chamou os Quatro Cavaleiros do Apocalipse:
- Crítica destrutiva: quando é a própria identidade da outra pessoa que é visada, em lugar dese questionarem os seus comportamentos;
- Menosprezo: quando se ridiculariza o outro, avaliando as suas capacidades com uma posturaarrogante;
- “Jogar à defesa”: evita-se uma interação positiva partindo do princípio de que o problemaestá sempre no outro;
- Afastamento: é a consequência de todo o processo descrito nos pontos anteriores.
Na minha experiência como orientador conjugal, surgem, por vezes, este tipo de disfunções. Um dos membros do casal “joga ao ataque” com a crítica destrutiva e o menosprezo; o outro, como reação, “encolhe-se”, “jogando à defesa”, ou dando sinais que preferia afastar-se do que continuar com a sessão. Ocorre, nestes contextos, uma pergunta que, com frequência, o primeiro dirige ao segundo: “então porque é que não dizes nada?”.
Confrontado com estas situações, procuro demonstrar que aquele tipo de atitudes alimenta-se reciprocamente. O casal fica enredado num círculo vicioso que, em espiral, vai aumentado a conflitualidade conjugal.
Bem nos aconselha o Papa Francisco quando nos diz que na família “é necessário usar três palavras: com licença, obrigado, desculpa”.
Furtado Fernandes
j.furtado.fernandes@sapo.pt
Artigo da edição de março do Jornal da Família