Juntos na Esperança

Instabilidade económica e social marcam o arranque do ano 2023 e o futuro é visto com apreensão. Uma radiografia cinzenta do mundo em que vivemos onde o teólogo Juan Ambrosio descortina sinais de esperança.

Já estamos a viver o ano de 2023. Para muitos de nós ele é olhado com muitas preocupações, pois anuncia-se bastante difícil. Ainda não nos libertámos totalmente da pandemia de COVID-19, nem muito menos das suas consequências, como esta estúpida e imoral guerra continua a deixar-nos todos em suspenso. Digo esta, referindo-me à que está a acontecer na Ucrânia, mas tenho consciência de que não é, infelizmente, a única, tal como todas têm sempre a marca da imoralidade e da estupidez.

As dificuldades revestem-se dos contornos mais variados. O custo de vida vai aumentando de mês para mês, sendo os bens mais essenciais aqueles que contribuem de uma maneira muito significativa para essa situação. O mundo da saúde apresenta enormes convulsões, de tal modo que assistimos perplexos ao encerramento de serviços essenciais, situação que mesmo não sendo permanente, levanta enormes preocupações. A habitação torna-se um bem cada vez mais caro e escasso, começando a constituir um problema muito sério mesmo para aquelas famílias que se inscrevem na chamada classe média. A educação também dá sinais preocupantes, com os seus profissionais a manifestarem uma crescente insatisfação com as condições de trabalho. Pais e alunos também não parecem estar satisfeitos com a situação em que se encontram. A justiça é vista com muita desconfiança, pois vai vingando a sensação de que é demasiado lenta e tem vários pesos e medidas conforme as pessoas e a sua classe social, ou situação. De um modo geral, o futuro é visto com alguma apreensão, a incerteza e o medo vão ganhando largos espaços.

Esta situação pode ajudar a perceber algo que, à primeira vista, até pode parecer paradoxal. Se é verdade esta sensação de incerteza e receio, também é verdade, pelo menos assim os mostram os meios de comunicação e as diversas redes socias, que os centros comerciais se encontram cheios, que há uma grande afluência nos restaurantes, que a hotelaria vê os números de ocupação a subirem, que as viagens aumentam de modo evidente. As pessoas, e bem, parecem querer começar a recuperar o tempo que a pandemia transformou. Outro sinal, que me parece igualmente evidente nesta linha, é o acentuar de um certo individualismo egoísta. Se não se sabe bem como vai ser o futuro, então o melhor será aproveitar o mais que se puder o tempo presente, concentrando-se cada um em si e nos seus.

Tenho bem consciência de que as notas atrás apontadas afetam sobretudos os mais frágeis. São eles os que sofrem de uma maneira mais impactante as consequências negativas do momento que estamos a viver, são também eles os primeiros a ser afastados dos territórios e das experiências que outros frequentam e praticam para lidar com os desafios.

Apesar do tom negativo atrás utilizado, continuo a recusar aceitar que a realidade seja essencialmente negativa. Não nego as evidências, mas continuo a reconhecer a existência de uma enorme dinâmica de bondade e positividade na nossa história. Nela reconheço, igualmente, aquela presença que sustenta o mundo e a vida. Apesar da incerteza referida, acredito sinceramente que a vida é um dom e um mistério magnífico. E acredito nisto a partir da fé em Deus criador e salvador.

É nesse sentido que gostaria de destacar duas palavras que ficaram a ressoar em mim, depois da leitura da mensagem do papa Francisco para o dia mundial da paz, recentemente celebrado: «juntos» e «esperança»

Para melhor se perceber o que com elas pretendo partilhar, transcrevo duas pequenas partes da mensagem a partir das quais podemos articular essas palavras.

Começo pela referência ao «juntos»: “de tal experiência, brotou mais forte a consciência que convida a todos, povos e nações, a colocar de novo no centro a palavra «juntos». Com efeito, é juntos, na fraternidade e solidariedade, que construímos a paz, garantimos a justiça, superamos os acontecimentos mais dolorosos.”

E em relação à «esperança» podemos ler: “quais são os novos caminhos que deveremos empreender para romper com as correntes dos nossos velhos hábitos, estar melhor preparados, ousar a novidade? Que sinais de vida e esperança podemos individuar para avançar e procurar tornar melhor o nosso mundo?”

Na conclusão da mensagem podemos também encontrar a articulação que procuro destacar, por me parecer ser a atitude certa a assumir durante todo este ano de 2023:

“Compartilho estas reflexões com a esperança de que, no novo ano, possamos caminhar juntos valorizando tudo o que a história nos pode ensinar. Formulo votos de todo o bem aos Chefes de Estado e de Governo, aos Responsáveis das Organizações Internacionais, aos líderes das várias religiões. Desejo a todos os homens e mulheres de boa vontade que possam, como artesãos de paz, construir dia após dia um ano feliz! Maria Imaculada, Mãe de Jesus e Rainha da Paz, interceda por nós e pelo mundo inteiro.”

Juntos na esperança é o desafio a que somos convocados e parece-me ser também o caminho que temos de percorrer.

Juan Ambrosio
Artigo da edição de janeiro de 2023 do Jornal da Família

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