A Via-Sacra pelas fragilidades dos jovens

As fragilidades dos jovens deram corpo à Via-Sacra presidida pelo Papa Francisco na JMJ Lisboa 2023. Furtado Fernandes analisa, na edição de outubro do Jornal da Família, a densidade da sua mensagem.

Escrever sobre os diversos eventos que integraram a JMJ de Lisboa – que foi “belíssima” e a “mais bem preparada” nas palavras do Santo Padre – seria tarefa impossível no espaço reservado para este artigo.

A opção foi a Via-Sacra pelas Fragilidades dos Jovens atento o seu simbolismo e a densidade das suas mensagens que, nas 14 estações, abordaram as angústias que fustigam não só jovens, mas, também, pessoas de outros estratos etários. Com este propósito foram selecionados para nossa reflexão/oração os seguintes temas: pobreza, violência, solidão, falta de compromisso, intolerância, individualismo, saúde mental, destruição da criação, dependências, incoerência, crises humanitárias, produtivismo, desinformação – intoxicação e medo do futuro.

Quando analisamos em conjunto cada um dos aspetos referenciados, facilmente se compreende que eles têm conexões, configurando um paradigma deveras problemático de que a verdadeira felicidade – entenda-se a felicidade duradoura – anda arredia.

  • Individualismo, incoerência, produtivismo, falta de compromisso, solidão, dependências e saúde mental.

A máxima do “salve-se quem puder” transforma, como se sabe, o mundo numa selva. Todos aqueles que não produzem – as pessoas portadoras de deficiência, os desempregados, os idosos – são descartados.

Instala-se o narcisismo, o culto das aparências, a coerência pessoal é desprezada.

A solidariedade é uma palavra vã, cada um fica confinado ao cárcere do seu egoísmo, pensando ilusoriamente que é livre.

Esta miopia está bem patente no livro A Insustentável Leveza do Ser de Milan Kundera – “Ninguém tem missão nenhuma. É um alívio enorme uma pessoa perceber que é livre, que não tem missão nenhuma”.

O resultado desta cultura hedonista é conhecido, mais cedo ou mais tarde emerge o ferrete da solidão. A vida tem “altos” e “baixos”, daí dizer-se, com propriedade, que é nos revezes que se conhecem os amigos.

A solidão é, por muitos, interiorizada como abandono que vão “compensar” na droga, na pornografia, no álcool. Não se trata, bem entendido, de uma cura, mas, tão somente, de uma anestesia.

É a saúde mental que é afetada, daí a frequência com que surgem transtornos tais como a ansiedade e a depressão.

  • Pobreza, intoxicação – desinformação, intolerância, violência, crises humanitárias, destruição da criação e medo do futuro

O Papa Francisco, na Alegria do Evangelho, afirma com a clareza que é seu apanágio: “Assim como o mandamento «não matar» põe um limite claro para assegurar o valor da vida humana, assim também hoje devemos dizer «não a uma economia de exclusão e da desigualdade social». Esta economia mata”.

A equitativa distribuição da riqueza que seja produzida de forma sustentável é, seguramente, um contributo eficaz para mitigar as crises humanitárias e, simultaneamente, salvaguardar os equilíbrios ecológicos necessários para a preservação da criação de modo que não seja hipotecado o futuro das gerações vindouras.

A Justiça para ser um efetivo meio de construção da Paz requer, também, que a intoxicação – desinformação cesse de acirrar a intolerância que faz perigar os direitos, liberdades e garantias das pessoas e a soberania dos Estados.

O epílogo natural das fragilidades assinaladas na Via-Sacra é o medo do futuro, para o superar importa atentar, designadamente, nas palavras proferidas pelo Papa Francisco na sua abertura:

“Hoje caminhareis com Jesus. Jesus é o Caminho e nós caminharemos com Ele, porque Ele caminha. Quando estava entre nós, Jesus caminhou: curando doentes, prestando assistência aos pobres, fazendo Justiça; caminhou pregando, ensinando-nos.”


Furtado Fernandes
j.furtado.fernandes@sapo.pt
Artigo da edição de outubro de 2023 do Jornal da Família

Foto: Nuno Moreira | JMJ Lisboa 2023
Via-Sacra JMJ Lisboa 2023 – Colina do Encontro (Parque Eduardo XVII)

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