Há já muito tempo que diariamente nos entram pela casa adentro as horrorosas imagens da guerra. Pensando bem, a guerra, nas suas mais diversas formas, tem sido, quase sempre, uma constante nos noticiários de todos os canais televisivos. E mesmo quando em poucas ocasiões não se lhe dá um grande destaque, podemos ter a certeza de que em alguma parte do mundo ela está a acontecer.
Ao constatar esta realidade não posso deixar de interrogar-me acerca da sua razão de ser. Porque é que a brutalidade, e a maldade parecem ter o predomínio, quando se trata de dar conta do que aconteceu ao longo do dia? Porque essa é a realidade, dirão muitos, espantados com a ingenuidade da pergunta. Não tenho dúvidas de que a brutalidade e a maldade sejam uma realidade, mas recuso-me a aceitar que sejam a realidade. Aliás, continuo a acreditar que o mundo e a existência, como já várias vezes tive a oportunidade de partilhar nestas linhas, são sustentados pelo amor e pela bondade. E porque sou crente, afirmo que esse amor e bondade são dinamismos vitais alimentados por Deus. Se assim não fosse, não tenho a menor dúvida de que a existência neste planeta já se teria tornado insustentável.
Dito isto, que me parece muito importante para não darmos a primazia àquilo que não a tem e não a pode ter, não quero em nada diminuir o peso dos horrores da guerra. O que vemos e ouvimos todos os dias, que nos leva mesmo a pensar na banalização do mal, não pode deixar de nos interpelar e desinquietar, pois não podemos correr o risco de nos habituarmos à guerra como se ela fosse algo de inevitável e normal. Não o pode ser! Não podemos permitir que o seja!
Tenho bem a consciência da enorme dificuldade existente em silenciar as armas. São muitos e muito complexos os fatores e interesses que concorrem para esta situação. Entre eles, convém que tenhamos bem presente como a indústria da guerra é hoje uma das mais bem-sucedidas, alimentando com muitos milhões as carteiras de uns quantos, que são muito poucos, quando comparados com os muitos que perdem a vida, e os muitos mais que a vêm maltratada e espezinhada. O que a este propósito se passa não pode deixar de ser denunciado. Certamente esta não será a única explicação, pode até que não seja a mais importante, para nos ajudar a perceber o porquê da guerra, mas não a podemos esquecer no momento em que somos chamados a tomar decisões e desenvolver ações no sentido de pormos fim aos seus horrores.
Neste contexto, não são poucos aqueles que defendem esta indústria, aludindo que ela é necessária para nos ajudar a garantir a paz. Para sustentar este posicionamento, socorrem-se da muito conhecida afirmação: se queres a paz prepara-te para a guerra. Sou capaz de reconhecer como nos nossos dias o chamado poder de dissuasão tem evitado muitos conflitos e, quando não os evita, pelo menos ajuda a mantê-los minimamente circunscritos, no entanto, estou sinceramente convencido de que o caminho tem de ser outro e passa também, principalmente diria mesmo, pela educação.
Digo isto tendo bem presente as imagens que nos testemunham o ódio com que as novas gerações estão a ser educadas nos contextos das situações de guerra. Enquanto assim for, creio que será muito difícil, para não dizer mesmo impossível, impedir a sua escalada.
Se queremos a paz, temos de nos preparar para a paz. Temos de educar as novas gerações nesta linha. Enquanto alimentarmos o ódio só seremos capazes de gerar mais ódio. Temos de ter a coragem de inverter o círculo, alimentando a paz. Claro que isto é muito difícil de se fazer, claro que isto não acontece de um dia para o outro, mas para acontecer, não tenhamos dúvidas, tem de ser tentado.
A este propósito quero citar aqui a recente Exortação do papa Francisco escrita por ocasião do 150º aniversário do nascimento de Santa Teresa do Menino Jesus e da santa Face. No seu nº 52 podemos ler:
“Do céu à terra, a atualidade de Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face permanece em toda a sua «pequena grandeza».
Num tempo que nos convida a fechar-nos nos próprios interesses, Teresinha mostra a beleza de fazer da vida um dom.
Num período em que prevalecem as necessidades mais superficiais, ela é testemunha da radicalidade evangélica.
Numa época de individualismo, ela faz-nos descobrir o valor do amor que se torna intercessão.
Num momento em que o ser humano vive obcecado pela grandeza e por novas formas de poder, ela aponta a via da pequenez.
Num tempo em que se descartam tantos seres humanos, ela ensina-nos a beleza do cuidado, do ocupar-se do outro. […].”
São estas «pequenas grandes coisas» que temos de ter presentes na educação das novas gerações. São elas o fundamento sólido de uma educação para a paz.
Juan Ambrosio
juanamb@ucp.pt
Artigo da edição de novembro de 2023 do Jornal da Família