Escravidão e liberdade são dois conceitos presentes na mensagem do Papa Francisco para esta Quaresma. Intitulada “Através do deserto, Deus guia-nos para a liberdade”, nela o Papa fala de um caminho quaresmal concreto que implica “querer ver a realidade”. Tal como no tempo dos Faraós, “também hoje o grito de tantos irmãos e irmãs oprimidos chega ao céu”, escreve Francisco” para depois se interrogar: “E chega também a nós? Mexe connosco? Comove-nos?”
Para o Papa “há muitos fatores que nos afastam uns dos outros, negando a fraternidade que originariamente nos une” e, recordando a viagem a Lampedusa, a que chamou a “globalização da indiferença”, volta a perguntar: “«Onde estás?» (Gn 3, 9) e «Onde está o teu irmão?» (Gn 4,9)”.
Francisco continua a interrogar-se: “Desejo um mundo novo? E estou disposto a desligar-me dos compromissos com o velho?”. Baseado no testemunho de bispos e agentes de paz e justiça, o Papa está convencido que é preciso denunciar “um défice de esperança”. Perante uma humanidade que atingiu níveis de progresso científico, técnico, cultural e jurídico capazes de garantir a todos a dignidade “tateie ainda na escuridão das desigualdades e dos conflitos”.
Para Francisco “mais temíveis que os Faraós são os ídolos”, uma espécie de “voz do inimigo” que “em vez de nos pôr em movimento, paralisar-nos-ão”. “Poder tudo, ser louvado por todos, levar a melhor sobre todos: todo o ser humano sente dentro de si a sedução desta mentira. É uma velha estrada”, escreve o Papa. Mas para Francisco existe “uma nova humanidade, o povo dos pequeninos e humildes que não cedeu ao fascínio da mentira”, “uma força silenciosa de bem que cuida e sustenta o mundo”.
“É tempo de agir e, na Quaresma, agir é também parar: parar em oração, para acolher a Palavra de Deus, e parar como o Samaritano em presença do irmão ferido”, escreve Francisco. “Por isso, oração, esmola e jejum não são três exercícios independentes, mas um único movimento de abertura, de esvaziamento” capazes de lançar fora os “ídolos” e os “apegos que nos aprisionam”, refere o Papa.
Recordando a caminhada sinodal da Igreja, Francisco sugere que a Quaresma seja também um tempo de decisões comunitárias” capazes de modificar a vida quotidiana das pessoas e das coletividades. O Papa fala em pequenos gestos relacionados com o repensar dos estilos de vida como “os hábitos nas compras, o cuidado da criação, a inclusão de quem não é visto ou é desprezado”.
Só na medida em que a Quaresma for tempo de “conversão” a humanidade vislumbrará “o lampejar de uma nova esperança”, defende Francisco, terminando a mensagem com uma das frases do discurso aos estudantes universitários na JMJ Lisboa 2023: “«Procurai e arriscai; sim, procurai e arriscai. Neste momento histórico, os desafios são enormes, os gemidos dolorosos: estamos a viver uma terceira guerra mundial feita aos pedaços. Mas abracemos o risco de pensar que não estamos numa agonia, mas num parto; não no fim, mas no início dum grande espetáculo. E é preciso coragem para pensar assim»”.
“É a coragem da conversão, da saída da escravidão. A fé e a caridade guiam pela mão esta esperança menina. Ensinam-na a caminhar e, ao mesmo tempo, ela puxa-as para a frente”, concluiu Francisco.
IM