Sobre este tema, que é polémico, muito se tem divulgado ultimamente. O espectro de previsões é muito diversificado, salientando-se que algumas versões são muito radicais, reduzindo o conceito a um processo de âmbito digital, virtual. Independentemente do modelo, existe unanimidade quanto à necessidade da sua integração ou ligação aos sistemas clássicos de cuidados de saúde, garantindo a segurança do doente, evitando a criação “duma “ilha isolada”. O objetivo é contribuir para a melhoria da qualidade assistencial em prol da saúde e bem-estar da comunidade.
Tendo em conta a nossa experiência adquirida ao longo de décadas, assim como os dados disponíveis sobre a evolução, tendências e progressos da Ciência e da Medicina, importa referir certos pressupostos e realidades que poderão legitimar a mudança de padrões assistenciais no futuro, mais ou menos próximo. De acordo com a literatura disponível, eis os tópicos que selecionámos:
1 – Planeamento: importa atender ao panorama demográfico de redução da natalidade, idade mais tardia da mulher no primeiro parto e envelhecimento da população.
2 – Prática clínica: importa respeitar cada vez mais as recomendações emanadas de comissões de peritos e de sociedades científicas implicando atender à qualidade e diferenciação dos profissionais e à necessidade de certificação regular obrigatória das respetivas competências.
3 – Educação médica contínua/Formação: importa investir em instrumentos complementares como o ensino baseado em simulação e a aplicação da inteligência artificial.
4 – Novas áreas do conhecimento de grande potencial: importa investir na telemedicina, na medicina regenerativa, na bioengenharia, na investigação genómica, na neuro-endócrino-psico-biologia, na biologia molecular, nas transplantações e na terapêutica com linhas celulares estaminais.
5 – Redes nacionais e internacionais interinstituições: importa valorizar e desenvolver o já existente conceito de regionalização, assim como o papel orientador do médico de família no reencaminhamento de doentes em ligação à estrutura hospitalar da respetiva região.
6 – Transporte com unidades móveis, operando na terra, mar e ar: importa investir em equipas especializadas e equipamento sofisticado com apoio de robots/drones no transporte de medicamentos e na cirurgia endoscópica, valorizando exames complementares cada vez menos invasivos.
7 – Filosofia assistencial e inovação: importa investir no hospital/edifício, que passará a ser desenhado em moldes diferentes, cada vez com menores dimensões; na ampliação das áreas vocacionadas para o ambulatório e redução das áreas de internamento, o qual passará a ser quase residual, apenas para os casos muito complexos e, progressivamente, com menor duração; – na vigilância do doente monitorizado à distância; – na assistência centrada na família; – no desenvolvimento de espaços abertos amplos em detrimento dos pequenos quartos, isto é, no reagrupamento de modo diverso da distribuição clássica das camas, considerando a situação clínica global do doente e não especialidades de órgão ou sistema. Isto, em obediência à afirmação de William Osler (1849-1919), fundador da medicina científica: “ importa mais conhecer o doente que tem a doença do que a doença que o doente tem”.
8 – Registo de dados clínicos: importa investir na melhoria da informatização e na prescrição por computador; – na figura do médico ou enfermeiro gestor do doente crónico valorizando o desenvolvimento da atitude de humanização e do grau de satisfação das famílias; – no desenvolvimento dos sistemas de qualidade organizativa e de prevenção de riscos, em prol do atingimento da excelência clínica; – no desenvolvimento do controlo da qualidade, que passará da apreciação entre pares para a análise de resultados; – no desenvolvimento de boas práticas em comparação com boas práticas observadas noutras instituições “rivais” visando atingir a excelência (investimento no chamado benchmarking).
Nota final: benchmark’ (análise estratégica das melhores práticas em prol de melhor qualidade, usadas por instituições afins, as quais poderão ser levadas a cabo noutras instituições). Trata-se de um instrumento de gestão cujo objetivo é aprimorar processos, produtos e serviços. Fora do âmbito da Saúde, o conceito está mais ligado à ideia de “mais lucro e produtividade”.
Artigo da edição de agosto/setembro do Jornal da Família
João M. Videira Amaral
jmnvamaral@gmail.com
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