Entramos em 2025 com uma série de nuvens sombrias a pairar sobre as nossas cabeças.
A afirmação que encabeça este texto não traduz certamente a perspetiva mais desejável para um começo de ano. O ideal seria uma afirmação positiva e carregada de esperança. E, em certo sentido, podia começar por ela, pois já estamos em pleno Jubileu da Esperança. Prefiro, no entanto, ensaiar outro caminho, começando por um convite a reconhecer os desafios que enfrentamos e que não desapareceram no início deste ano. Depois, uma vez reconhecidos, podemos então identificar algumas ações concretas que nos possam ajudar a esperançar, ou seja, a fazer com que aquilo que esperamos possa acontecer com o nosso contributo e com o suporte, a ajuda e a interpelação do Deus encarnado, que ainda estamos a celebrar.
Nesse exercício recorro à mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial da Paz (1 janeiro de 2025). Nela somos convidados a reconhecer desafios e a assumir responsabilidades:
“Cada um de nós deve sentir-se, de alguma forma, responsável pela devastação a que a nossa casa comum está sujeita, a começar pelas ações que, mesmo indiretamente, alimentam os conflitos que assolam a humanidade. […]. Refiro-me, em particular, às desigualdades de todos os tipos, ao tratamento desumano dispensado aos migrantes, à degradação ambiental, à confusão gerada intencionalmente pela desinformação, à rejeição a qualquer tipo de diálogo e ao financiamento ostensivo da indústria militar. Todos estes são fatores de uma ameaça real à existência de toda a humanidade. No início deste ano, portanto, queremos escutar este grito da humanidade para nos sentirmos chamados, todos nós, juntos e de modo pessoal, a quebrar as correntes da injustiça para proclamar a justiça de Deus. Alguns atos esporádicos de filantropia não serão suficientes. Em vez disso, são necessárias transformações culturais e estruturais, para que possa haver também uma mudança duradoura.”
Reconhecendo, sem medo, os desafios e as responsabilidades, será então mais fácil compreender as mudanças culturais e estruturais que temos de urgentemente realizar, para fazer acontecer a esperança.
E o Papa aponta três ações possíveis nessa direção.
A redução, ou mesmo perdão, da dívida internacional:
“que se pense numa «consistente redução, se não mesmo no perdão total da dívida internacional, que pesa sobre o destino de muitas nações». Reconhecendo a dívida ecológica, os países mais ricos sentir-se-ão chamados a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para perdoar as dívidas dos países que não estão em condições de pagar o que devem. Certamente, para que não se trate de um ato isolado de beneficência, que corre o risco de desencadear de novo um ciclo vicioso de financiamento-dívida, é necessário, ao mesmo tempo, desenvolver uma nova arquitetura financeira que conduza à criação de um acordo financeiro global, baseado na solidariedade e na harmonia entre os povos.”
O respeito pela dignidade da vida humana e a eliminação da pena de morte:
“faço apelo a um firme compromisso de promover o respeito pela dignidade da vida humana, desde a conceção até à morte natural, para que cada pessoa possa amar a sua vida e olhar para o futuro com esperança, desejando o desenvolvimento e a felicidade para si e para os seus filhos. Com efeito, sem esperança na vida, é difícil que surja no coração dos jovens o desejo de gerar outras vidas. Particularmente neste sentido, gostaria de convidar, uma vez mais, para um gesto concreto que possa favorecer a cultura da vida. Refiro-me à eliminação da pena de morte em todas as nações. Em realidade, esta punição, além de comprometer a inviolabilidade da vida, aniquila toda a esperança humana de perdão e de renovação.”
A criação de um fundo mundial para eliminar a fome e realizar atividades educativas:
“neste tempo marcado pelas guerras: utilizemos pelo menos uma percentagem fixa do dinheiro gasto em armamento para a criação de um fundo mundial que elimine definitivamente a fome e facilite a realização de atividades educativas nos países mais pobres que promovam o desenvolvimento sustentável, lutando contra as alterações climáticas. Devemos tentar eliminar qualquer pretexto que possa levar os jovens a imaginar o seu futuro sem esperança, ou como uma expectativa de vingar o sangue derramado por seus entes queridos. O futuro é um dom que permite ultrapassar os erros do passado e construir novos caminhos de paz.”
Estas ações são, em primeira mão, interpelação aos dirigentes das Nações e das diversas instâncias internacionais, mas podem e devem ser traduzidas a outros níveis, mesmo os mais micro, como são cada uma das nossas famílias.
Estes e outros gestos concretos permitirão que empreendamos o caminho da esperança que nos leve à transformação do mundo e nos aproxime, também, da paz tão desejada e necessária.
E termino com um desejo e um pedido que recolho da mensagem:
“Que 2025 seja um ano em que a paz cresça.
[…]
Concede-nos, Senhor, a tua paz!”
Juan Ambrosio
juanamb@ucp.pt
Artigo da edição de janeiro de 2025 do Jornal da Família
Foto ilustrativa: Pixabay