Celebra-se no dia 28 de julho o IV Dia Mundial dos Avós e dos Idosos. Na mensagem do Papa Francisco para esta ocasião, com o título «Na velhice, não me abandones», dá-se um especial destaque ao problema da solidão que afeta muitos dos nossos avós e idosos, referindo muitas das causas que estão na sua origem e destacando duas.
Na primeira denuncia-se a manipulação inaceitável de opor os jovens aos idosos:
“Se pensarmos bem, está hoje muito presente por todo o lado esta acusação, lançada contra os velhos, de «roubar o futuro aos jovens»; sob forma diversa, aparece mesmo nas sociedades mais avançadas e modernas. Por exemplo, está já muito espalhada a convicção de que os idosos fazem pesar sobre os jovens os custos da assistência de que necessitam, subtraindo assim recursos ao desenvolvimento do país e, consequentemente, aos jovens. Trata-se duma visão distorcida da realidade: é como se a sobrevivência dos idosos colocasse em risco a dos jovens, ou como se, para favorecer os jovens, fosse necessário negligenciar os idosos ou mesmo eliminá-los. O contraste entre as gerações é um equívoco, um fruto envenenado da cultura do conflito. Opor os jovens aos idosos é uma manipulação inaceitável: «O que está em jogo é a unidade das idades da vida: ou seja, o verdadeiro ponto de referência para a compreensão e a apreciação da vida humana na sua totalidade».”
Na segunda refere-se o drama da cultura do individualismo:
“Aliás, há hoje muitas mulheres e homens que procuram a própria realização pessoal numa existência tão autónoma e desligada dos outros quanto possível. A recíproca pertença está em crise, acentua-se o individualismo; a passagem do «nós» ao «eu» constitui um dos sinais mais evidentes dos nossos tempos. A família, que é a primeira e a mais radical contestação da ideia de nos podermos salvar sozinhos, é uma das vítimas desta cultura individualista. Mas, quando se envelhece, à medida que as forças diminuem, a miragem do individualismo, a ilusão de não precisar de ninguém e de poder viver sem vínculos, revela-se o que verdadeiramente é: em vez disso, encontramo-nos a precisar de tudo, mas agora sozinhos, sem ajuda, sem ninguém com quem possamos contar. É uma triste descoberta, que muitos fazem quando já é demasiado tarde.”
Nem os idosos roubam qualquer futuro aos jovens, nem o individualismo constitui a configuração mais adequada para a nossa humanidade. Não tenhamos ilusões, não há verdadeira experiência da vida sem a experiência do outro.
A solidão não é o habitat propício para o ser humano. Nascemos do encontro e a vida é, em certo sentido, um permanente convívio, por isso sempre que descartamos alguém acabamos por ficar mais pobres e a vida torna-se menos humana. Não tenhamos também dúvidas, o modo como tratamos os nossos avós e idosos pode e deve ser visto como sinal de maturidade (ou falta dela) das nossas sociedades.
Por isso o forte convite que nos é dirigido:
“Neste IV Dia Mundial a eles dedicado, não deixemos de mostrar a nossa ternura aos avós e aos idosos das nossas famílias, visitemos aqueles que estão desanimados e já não esperam que seja possível um futuro diferente. À atitude egoísta que leva ao descarte e à solidão, contraponhamos o coração aberto e o rosto radioso de quem tem a coragem de dizer «não te abandonarei!» e de seguir um caminho diferente.”
Quero concluir estas linhas com uma nota pessoal. Faço-o porque este também tem sido espaço para a partilha de momentos e experiências intensas de vida, e por isso estou grato e nisso também se concretiza esta convicção de que a vida é convívio, ou seja, viver com outros, por causa dos outros, para os outros. A minha família está a crescer e preparamo-nos para, no próximo outubro, receber o nosso primeiro neto. Vou ser avô, vamos ser avós! É uma imensa alegria que me faz olhar para os meus avós e pais com um profundo sentido de gratidão. É mesmo o Mistério da vida a acontecer e sempre nesta teia de relações.
«Não te abandonarei»! Esta é aquela palavra forte que Deus dirige a cada um. Esta tem de ser também aquela palavra que traduza a nossa atitude de vida para com os nossos avós e idosos. Eles não são só o passado, são também o presente que nos pode dar a garantia de um futuro mais humano.
Juan Ambrosio
juanamb@ucp.pt
Artigo da edição de julho de 2024 do Jornal da Família